(Hellen Cecília Dias)
junho de 2012
A China possui atualmente uma das economias que mais crescem no mundo. A média de crescimento nos últimos anos é de quase 10% ao ano. Uma taxa superior a das maiores economias mundiais, e inclusive a do Brasil.
O Produto Interno Bruto (PIB) da China atingiu US$ 6,05 trilhões ou 39,8 trilhões de Yuan em 2010, fazendo deste país a segunda maior economia do mundo (apenas atrás dos Estados Unidos). A China é ainda um dos maiores importadores de matéria-prima e o maior produtor mundial de alimentos: 500 milhões de suínos, 450 milhões de toneladas de grãos; dentre eles milho e arroz. Em 2010, a balança comercial chinesa foi positiva em US$ 190 bilhões, com exportações de US$ 1,58 trilhão e importações de US$ 1,39 trilhão.
Tal crescimento é resultado da implementação bem sucedida de um plano de metas para o desenvolvimento econômico e modernização da China, realizado em 1987, sob a liderança de Deng Xiaoping.
O plano era composto por uma estratégia de crescimento com objetivos de longo prazo, dentre eles: dobrar o PIB Chinês relativo a 1980 e garantir a alimentação e o vestuário para todos os cidadãos, o segundo passo seria quadruplicar o PIB relativo a 1980 em 1999, com a entrada na economia de mercado, e o terceiro passo, segundo o governo Chinês, seria aumentar o PIB per capita para níveis de países em desenvolvimento até 2050, com a abertura econômica do país.
Foram realizados diversos planos de governo para iniciar uma abertura de mercado na China, com o objetivo de atrair investimentos estrangeiros, ampliar a indústria nacional e prover o desenvolvimento do país de acordo com as metas de seu plano estratégico de desenvolvimento; tais como:
- aumento nos investimentos na área de educação, principalmente técnica;
- investimentos em infraestrutura, com a construção de rodovias, ferrovias, aeroportos, prédios públicos e hidrelétrica;
- investimentos nas áreas de mineração, principalmente de minério de ferro, carvão mineral e petróleo;
- forte controle governamental dos salários e regras trabalhistas, garantindo o custo reduzido de mão-de-obra com baixos salários, fazendo dos produtos e mão de obra chineses os mais baratos do mundo,
- abertura da economia para a entrada do capital internacional, por meio de parcerias entre multinacionais que pretendiam se instalar no país e empresas locais, sob a condição de desenvolvimento da indústria nacional chinesa.
Com estes atrativos e possibilidades de retorno sobre o investimento, além de uma grande expectativa de crescimento do mercado interno da China, muitas empresas multinacionais, ou transnacionais se instalaram e continuam instalando filiais no país, buscando baixos custos de produção, mão-de-obra abundante e mercado consumidor amplo, tornando esta uma das maiores vantagens comparativas do país.
Com o aquecimento da economia chinesa tanto no mercado interno, quanto externo, há uma expectativa de crescimento nos investimentos em infraestrutura aeroportuária e serviços de transporte aéreo, pelas dimensões continentais do país, além de aumento da malha aérea na China.
A partir do crescimento da malha aérea voltada para o atendimento da aviação comercial, estima-se que as companhias aéreas chinesas deverão expandir sua frota de aviões para acima de 4.500 até o final de 2015 e adquirir aproximadamente 2.000 jatos de grande porte até 2025, tornando-se um dos maiores mercados do mundo.
A indústria de aviação é uma indústria estratégica que sempre é vista como um importante indicativo do nível do desenvolvimento da ciência e da tecnologia nacional, como também de sua capacidade de defesa, por isso, o governo da China anunciou que pretende investir um valor superior a US$ 232 milhões de dólares no setor de aviação civil nos próximos cinco anos.
Além da construção de aproximadamente 45 aeroportos, elevando o número total a 220 até 2015 e o fortalecimento da Indústria Chinesa de Aviação; que conta com 53 empresas de médio e grande porte, 31 institutos de pesquisa, 20 companhias e instituições empenhadas no comércio exterior, fornecimento de material, desenvolvimento de produtos, bem como de ciência e tecnologia aeronáutica.
Analisando este cenário, com expectativa de alta demanda no mercado interno chinês, empresas fabricantes de aviões, como Boeing, Airbus, Embraer e Bombardier, vislumbraram o crescimento do mercado e a instalação de fábricas ou escritórios no país para atender a este mercado potencial.
Com isso, a Embraer, terceira maior fabricante de jatos comerciais do mundo, abriu em 2002 sua primeira fábrica para produção de aeronaves comerciais na cidade de Harbin, uma
joint venture entre a Embraer e a empresa chinesa estatal AVIC II (Corporação de Indústria da Aviação da China), Harbin Aircraft Industry Co. Ltd (HEAI), que inicialmente foi autorizada a produzir somente o modelo ERJ-145, de 50 passageiros, para atender as encomendas de empresas aéreas chinesas como Grand China Express, controlada pelo grupo Hainan Airlines, tendo sido fabricados 50 jatos deste modelo na planta industrial chinesa.
Tal estratégia da Embraer já indica a implementação da terceira fase da teoria de ciclo de produto, com o início da produção internacional, ou seja a sua efetiva internacionalização, e não somente o posicionamento de uma empresa transnacional.
Além da Embraer, a empresa francesa Dassault Aviation transferiu seu escritório asiático para Pequim, e a General Eletric Co. está finalizando planos para uma
joint venture com uma fabricante de jatos militares chinesa para produzir aviônicos das aeronaves, este acordo com a AVIC, dará à GE acesso a um projeto do governo chinês para desafiar a Boeing e a Airbus no mercado de aviação civil.
A fabricante aeronáutica Airbus, também desenvolveu uma planta industrial na China, na cidade de Tianjin, para fabricação e montagem do jato A320, com expectativa de ciclo de produção de 4 jatos por mês em 2011 e entrega de 10 aviões de médio porte A219/320 desenvolvidos por esta unidade em 2010. Mas, com exceção da empresa brasileira, nenhuma empresa abriu uma fábrica permanente no país.
A implementação de
joint ventures no país é parte do plano de desenvolvimento da industria de aviação, instituído pelo Governo Chinês, com a transferência de
know-how e tecnologia de grandes parceiros e empresas multinacionais para a capacitação da industria aeronáutica chinesa, trata-se de uma barreira técnica do governo chinês para a entrada de produtos importados no país.
Mas tais acordos também têm os seus riscos, pois várias
joint ventures feitas no passado na China fracassaram porque os parceiros chineses, depois de conseguirem acesso à tecnologia e ao
know-how das empresas parceiras, tornaram-se poderosos rivais dos seus próprios parceiros.
Uma das barreiras protecionistas no país implementadas pelo governo são as burocracia internas e licenças de importação, que condicionam a aprovação de qualquer venda de empresas estrangeiras à aprovação do governo, além do cambio chinês, com o Yuan fixamente atrelado ao dólar.
Com isso, há a previsão de uma reviravolta na economia, porque as causas da crise financeira de 2008/2009 nos EUA não foram totalmente solucionadas, e com a desvalorização constante do dólar, muito dinheiro vem sendo impresso no país para cobrir os déficits na economia chinesa, com subvalorização do Yuan em relação ao valor do dólar.
Apesar da China ter adquirido algumas fábricas de produção, dentre as mais sofisticadas do comércio internacional e ter construído fábricas de engenharia avançada, capazes de fabricar equipamentos cada vez mais sofisticados, o que inclui armas nucleares e satélites. A maior parte de sua produção industrial ainda provem de fábricas ultrapassadas e pouco equipadas.
A China enfrenta também algumas dificuldades sociais que impendem o aumento da renda per capita no país. Considerando que boa parte da população se encontra em situação de pobreza, em função dos baixos salários, e vivem principalmente no campo, o país não investia em desenvolvimento científico e formação de mão de obra altamente qualificada para o aumento de renda e consequentemente, o aquecimento da economia no mercado interno, fato que vem sendo revisto na política interna do país.
Um outro fator de risco para as empresas que se instalam no país, trata-se da política de quebra de patentes, e o desrespeito aos direitos de propriedade intelectual na China, o qual pode acarretar em perdas econômicas em função de pirataria e apropriação indébita de projetos.
Embora a China tenha iniciado um pesado investimento para desenvolvimento de sua industria aeronáutica, o principal temor do setor aéreo é quanto a segurança das aeronaves chinesas, que em função de sua qualidade não passaram nas inspeções de qualidade de órgãos certificadores de aviação na Europa e EUA, restringindo sua operação apenas no mercado interno da China, sem possibilidade de exportação.
No entanto, mesmo para o mercado interno chinês, a industria aeronáutica local irá enfrentar barreiras, uma vez que na China a marca de um produto é fator determinante de credibilidade no público final, mais do que qualidade e preço, e este é o ponto em que a marca chinesa não tem ainda a credibilidade necessária para produtos de aviação, em relação às marcas reconhecidas como Boeing e Airbus.
A entrada dos chineses no mercado de aviação não será um risco no curto prazo, uma vez que o país ainda possui seu diferencial competitivo na manufatura de baixo custo e larga escala; mas o tigre asiático já se prepara para atacar.
Se o governo chinês investir todo o seu potencial, planejamento e orçamento para o desenvolvimento de uma indústria de tecnologia forte, qualificar tecnicamente sua mão de obra, e se adequar às legislações necessárias, com o planejamento e determinação que implementaram seu plano estratégico de desenvolvimento, é fato que dentro de 10 a 20 anos, a indústria de tecnologia chinesa terá se desenvolvido e passará a ser considerado um player internacional neste segmento de mercado, fornecendo serviços de terceirização na fabricação de aeronaves ou fabricando aviões de baixo custo para o seu mercado interno, ficando somente o desafio de mudar a sua reputação de marca em seus produtos e serviços.
Neste mesmo período, Europa e Estados Unidos ainda sofrerão com as demandas e pressões no seu mercado doméstico, com altos e complexos planos de desenvolvimento e mão de obra cara, o que irá forçar as empresas aeronáuticas a cada vez mais buscar pela fabricação de seus produtos em países de mão de obra mais barata, como a China, por isso, ainda que corram o risco de quebra de patente, aceitarão os acordos de
joint venture propostos pela China, para poderem aumentar suas margens de lucro.
O mercado Europeu irá pressionar cada vez mais a ONU e os órgãos reguladores para cobrar a China com relação às legislações ambientais e trabalhistas para balanceamento do mercado internacional. O governo chinês com foco em seu plano estratégico até 2025, poderá ceder alguns pontos para ser aceito no mercado internacional e ampliar seu mercado consumidor, no entanto, ainda que cedam com relação às questões ambientais e trabalhistas, o custo da mão de obra da China ainda será baixo em função do limitado volume de benefícios concedidos pelo governo chinês em relação às leis trabalhistas europeias e americanas.
Mesmo com o aumento dos salários, a demanda de empregos por pessoas altamente qualificadas ainda terá um deficit, caso o governo não implemente um plano de educação, tal qual implantado na India, para a qualificação de mão de obra altamente especializada.
Consequentemente, em função do aumento dos custos de mão de obra e implementação das legislações internacionais, os custos dos produtos chineses aumentarão, e em contra partida os mercados muito conservadores, como a Europa, tenderão a flexibilizar suas leis trabalhistas e salários, como forma de sair da crise, diminuir o desemprego e aumentar sua produtividade.
Os próximos anos dirão se a estratégia de implementação de fábricas e
joint ventures de aviação na China será reformulada ou não. Mas um princípio deve ser compartilhado por todas as maiores multinacionais do mundo: estar presente na China é uma obrigação, não importa o setor.
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Fontes:
China and the World, World Economic Forum - COMMITTED TO IMPROVING THE STATE OF THE WORLD, 2006Apoio a Industria de aviação na China ameaça concorrentes - economia.ig Air China International - fly-airchina.com Chineses prometem avião ate 190 assentos para 2014 - defesabr.com - 14/11/2009Embraer confirma compra de jatos pelo governo chines - veja.abril.com.br - 12/04/2011Embraer completa 50 dias parada na China - hangar20.com.br - 12/06/2011China deve manter acordo com o Brasil na Aviação - politicaexterna.com - 4/03/2011O dinheiro para aviação está na China - instoedinheiro.com.brGoverno vai investir 164 mil ME na aviação civil - visao.pt - 12/07/2011Chineses, engenharia reversa na aviação - Yahoo - 25/03/2011Harbin entrega primeiro jato ERJ 145 - revista fator - 02/10/2007Airbus entrega primeiro A320 fabricado na China - jn.pt - 21/06/2011China monta jato de 90 lugares - webluxo.com.br - 21/05/2007China Airway - airway.uol.com.brAs condições da China para joint ventures - blog ning - 30/12/2010Brasil e China fazem parceria na área de aviação - agencia noticias - 02/12/2002China investira 1,5 trilhao de yuans no setor de aviação - asasbrasil.com.br - 07/04/2011www2.anac.gov.br/certificacao/Entrevista frederico curado - defesanet.net - 31/07/2011China inicia centro de montagem de programa aeronautico - ccibc.com.br - 08/06/2009