quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Considerações sobre a crise financeira de 2008

(Caroline Guedes)


A crise financeira de 2008 foi a maior da história do capitalismo desde a grande depressão de 1929. Começou nos Estados Unidos após o colapso da bolha especulativa no mercado imobiliário, alimentada pela enorme expansão de crédito bancário e potencializada pelo uso de novos instrumentos financeiros, a crise financeira se espalhou pelo mundo todo em poucos meses.
A crise foi deflagrada após os ataques de 11 de setembro, quando o governo americano, em resposta a ofensiva terrorista, se envolveu em duas grandes guerras, no Iraque e Afeganistão, dispendendo maiores recursos do que o possível. Em paralelo, a economia interna americana já enfrentava um déficit em sua balança comercial. Com a injeção de recursos advindo da China e da Inglaterra, os bancos passaram a oferecer mais crédito, inclusive a clientes considerados de risco. A expansão do crédito financiou a bolha imobiliária, já que a grande procura por imóveis elevou o seu preço a altos valores. Esta valorização influenciou a elevaçãoda taxa de juros, resultando no aumento da inadimplência, pois as pessoas já não viam sentido em continuar pagando hipotecas exorbitantes quando as propriedades estavam perdendo valor.
Frente às críticas contra a política de socorro aos banqueiros praticada pelo governo americano, a Casa Branca decidiu não mais interferir na administração financeira dos bancos para socorrê-los. Com isso, o banco de investimento Lehman Brothers foi à falência no dia 15 de setembro de 2008, após a recusa do Federal Reserve (Fed, banco central americano) em injetar recursos na instituição.Essa atitude do Fed teve um grande impacto sobre o estado de confiança dos mercados financeiros, rompendo a convenção dominante de que a autoridade monetária norte-americana iria socorrer todas as instituições financeiras afetadas pelo estouro da bolha especulativa no mercado imobiliário.

O rompimento dessa convenção produziu pânico entre as instituições financeiras, o que resultou num aumento significativo da sua preferência pela liquidez, principalmente no caso dos bancos comerciais. O aumento da procura pela liquidez detonou um processo de venda de ativos financeiros em larga escala, levando a um processo de “deflação de ativos”, com queda súbita e violenta dos preços dos ativos financeiros, e contração do crédito bancário para transações comerciais e industriais. A “evaporação do crédito” resultou numa rápida e profunda queda da produção industrial e do comércio internacional em todo o mundo.

Com efeito, no último trimestre de 2008 a produção industrial dos países desenvolvidos experimentou uma redução bastante significativa, apresentando, em alguns casos, uma queda de mais de 10 pontos base com respeito ao último trimestre de 2007. Mesmo os países em desenvolvimento, que não possuíam problemas comseus sistemas financeiros, como o Brasil, também constataram uma fortíssima queda na produção industrial e no Produto Interno Bruto (PIB). De fato, no caso brasileiro, a produção industrial caiu quase 30% no último trimestre de 2008 e o PIB apresentou uma contração anualizada de 14% durante esse período.
Os governos dos países desenvolvidos responderam a essa crise por meio do uso de políticas fiscal e monetária expansionistas. O Fed reduziu a taxa de juros de curto prazo para 0% e aumentou o seu balanço em cerca de 300% para proporcionar liquidez para os mercados financeiros nos EUA. Políticas similares foram adotadas pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo Banco do Japão. Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama conseguiu aprovar uma expansão fiscal de quase US$ 800 bilhões para estimular a demanda agregada. Na área do euro, os governos foram liberados das amarras fiscais do Tratado de Maastricht, sendo autorizados a aumentar os déficits fiscais além dos limites impostos pelo Tratado em consideração. Esforços similares foram realizados no Reino Unido e nos países em desenvolvimento.
Na China, por exemplo, o governo aumentou o investimento público – fundamentalmente em infraestrutura – em mais de US$ 500 bilhões com o intuito de manter uma elevada taxa de crescimento econômico. No Brasil, a expansão fiscal começou antes da expansão monetária devido a um “comprometimento irracional” do Banco Central (BC) com um regime de metas de inflação muito rígido. Nesse contexto, o governo Lula aprovou um pacote de estímulo fiscal no fim de 2008, constituído de aumento do investimento público, redução de impostos e aumento do salário mínimo e do seguro desemprego. A redução da taxa de juros começou apenas em janeiro de 2009, após o colapso da produção industrial e da disseminação de rumores quanto a possível demissão do presidente do BC. Como resultado da demora no relaxamento na política monetária, o PIB declinou 0,7% em 2009.

Apesar da forte queda da produção industrial e do PIB tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, a severidade da crise de 2008 ficou muito aquém dos resultados catastróficos verificados na década de 1930. No fim de 2009, a economia americana começou a apresentar sinais positivos de recuperação, apontando para um crescimento modesto em 2010. França e Alemanha saíram da recessão técnica em meados de 2009, o mesmo ocorrendo com o Reino Unido no último trimestre desse ano.

Os países em desenvolvimento tiveram um desempenho econômico muito superior ao dos países desenvolvidos durante a crise. O crescimento econômico da China foi de 8,5% em 2009, mostrando uma pequena redução com respeito a 2008, quando a economia cresceu 9%. A performance econômica da Índia também foi boa. Após uma expansão de 7,3% do PIB em 2008, o crescimento foi reduzido para 5,4% em 2009. A performance econômica do Brasil durante a crise não foi tão boa como a da China e da Índia. Após um crescimento robusto de 5,1% em 2008, o PIB caiu 0,7% em 2009. Em 2010, contudo, a economia brasileira apresentou uma forte recuperação, apresentando um crescimento econômico superior a 7%. Entre os Brics, apenas a Rússia apresentou uma queda forte do nível de atividade econômica. Com efeito, o PIB da Rússia caiu 7,5% em 2009, após um crescimento de 5,6% em 2008.
A crise financeira de 2008 foi um desastre que poderia ter sido evitado e, no entanto, foi provocado por vários erros de regulamentação do governo, pela má administração das empresas e pela insensata avidez do risco de Wall Street. Segundo a comissão governamental que investigou a crise financeira, duas administrações foram responsáveis pelo desdobramento da crise, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) e outras agências reguladoras que permitiram uma mistura calamitosa: a concessão descuidada de empréstimos hipotecários, a excessiva combinação de instrumentos financeiros e as vendas de empréstimos a investidores, além das apostas arriscadas com títulos respaldados pelos empréstimos. Além das ações dessas instituições, a incoerente resposta do governo Bush à crise, permitindo que o Lehman Brothers fosse à falência depois de socorrer outro banco, o Bear Stearns, com ajuda do Fed, também foi apontada pela comissão como um ato de omissão diante do desencadeamento da crise financeira de 2008.

Referências

Crise financeira de 2008 poderia ter sido evitada. São Paulo:O Estado de São Paulo, 2011. Disponível em <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,crise-financeira-de-2008-poderia-ter-sido-evitada,671578,0.htm>. Acessado em 28 de Janeiro de 2013.
O que causou a crise econômica mundial entre 2008 e 2009?. Revista Nova Escola. Abril, 2009. Disponível em <http://revistaescola.abril.com.br/geografia/fundamentos/causou-crise-economica-mundial-470382.shtml>. Acessado em 28 de Janeiro de 2013.

Oreiro, José Luiz. Origem, causas e impacto da crise. Valor Econômico. Globo, 2011. Disponível em <http://jlcoreiro.wordpress.com/2011/09/13/origem-causas-e-impacto-da-crise-valor-economico-13092011/>. Acessado em 28 de Janeiro de 2013.

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