segunda-feira, 25 de junho de 2012

A internacionalização da Vale

(Bertille Chicoulaa)

 Um estudo realizado pelo Boston Consulting Group, de 2009, chama a atenção para um importante fator: a transformação do mercado global através da inserção de empresas provenientes de economias emergentes e as razões e consequências desse processo.

 O estudo faz menção aos 100 novos empresas globais, que são constituídos, em sua maioria, por empresas pertencentes aos BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) e liderados pela China, em especial. O Brasil conta com 14 empresas nesse ranking como, por exemplo: Vale, Natura, Braskem, Petrobrás, entre outras.

 Fruto da constante e crescente globalização, o processo de internacionalização é cercado de múltiplas variáveis e desafios. Nesse contexto, a mineradora Vale têm um papel de destaque: é considerada a segunda maior mineradora do mundo. Dados recentes a colocam, inclusive, como empresa líder do setor, segundo publicação da revista estado-unidense Forbes.

 Os principais periódicos do mundo destacam a crescente contribuição dessas corporações na economia mundial e, consequentemente, diversos estudos têm sido elaborados na tentativa de compreender o movimento dos “late movers”.

 Os princípios da internacionalização

 Segundo Dunning - economista britânico -, a internacionalização é um conjunto de três vantagens competitivas: vantagens específicas de Propriedade, vantagens específicas de Localização e vantagens específicas de Internalização.

 As vantagens específicas de propriedade fazem referência aos ativos tangíveis (recursos naturais, mão de obra) e intangíveis (marca, imagem). Dessa forma, é natural esperar que o diferencial competitivo das empresas provenientes de economias emergentes esteja baseado em ativos tangíveis, já que não é de se esperar vantagens advindas de ativos intangíveis.

 As vantagens específicas de localização estão relacionadas a localidade onde será implementada a operação internacional. As vantagens podem ser denominadas de estruturais (quando fatores decorrentes das condições do local irão influenciar o desempenho da subsidiária) ou transacionais (pelo fato de instalar operações em outro país o processo de coordenação de ativos é modificado). Os “late movers”, no caso, podem se aproveitar dos seguintes benefícios: estruturais (incentivos fiscais, proximidade mercado consumidor), criação de condições institucionais mais propícias (mercado mais estável), vantagens transacionais associadas a participação em cadeias globais de formação de valor.

 Por último, as vantagens específicas de internalização, que dizem respeito aos possíveis benefícios oriundos dos investimentos feitos: acesso e transferência de capital, conhecimento e o contorno de barreiras comerciais geralmente impostas visando a proteção das empresas locais, entre outros.

 Historia da Vale

 A criação da Vale está atrelada ao contexto da Segunda Guerra Mundial. Tal evento foi o responsável pelo aumento na demanda de matéria-prima, visto que as potências ocidentais – principalmente Estados Unidos e Inglaterra - tinham que garantir o fornecimento de matérias primas estratégicas durante a guerra. Todo o destino da produção da Vale até o ano de 1945 era destinado a Inglaterra.

Em 1945, com o fim da 2ª Guerra, no entanto, a Vale precisou diversificar mercados, já que os objetivos iniciais da sua criação não mais faziam sentido. Dessa maneira, ao longo das décadas, a estratégia da companhia manteve-se de acordo com o que foi estabelecido no pós II Guerra Mundial: diversificação do mercado e consolidação no cenário internacional. Podemos citar a política de investimentos ao longo dos anos como, por exemplo, a criação a subsidiária Docenave, em 1962, que investiu na construção de uma frota própria de navios para atender a demanda dos seus clientes, participações acionárias em diversas empresas públicas e privadas, entre outras ações que garantiram escala global a Vale.

 É importante ressaltar que apesar da influência no cenário nacional e internacional, a participação da Vale no exterior esteve durante muitos anos limitada a escritórios comerciais que visavam facilitar as relações com os principais clientes sem, efetivamente, ter investimentos de grande porte em projetos de extração mineral.

 A década de 1990 merece atenção especial. É ao longo desses dez anos que a empresa sofre a principal transformação: a privatização. O que pode ser interpretado como o grande impulsionador para a Vale transformar-se em uma das líderes do setor mundial.

 Além dos eventos internos da companhia, uma serie de eventos políticos e econômicos do Brasil contribuíram para a ascensão da empresa. Podemos citar, por exemplo, o plano real, o controle inflacionário e o próprio MERCOSUL. As transformações das bases do modelo econômico e social do países são apontadas, entre outros fatores, como incentivadores no processo de internacionalização das multinacionais de países emergentes.

A Vale Hoje

 A Vale é líder mundial na produção de minério de ferro, e segunda maior produtora de níquel. Atua por meio de escritórios, operações, explorações e joint ventures, e é a segunda maior mineradora diversificada do mundo e a maior das Américas em valor de mercado. Com sede no Brasil, está presente em 38 países e emprega direta e indiretamente mais de 170 mil pessoas em todo o mundo.

 Além do Brasil, a Vale está presente em outros cinco países na América do Sul (Colômbia, Peru, Chile, Paraguai e Argentina), com atividades de mineração e / ou também projetos logísticos para estruturar suas atividades. Assim, a integração econômica e política que resulta do MERCOSUL foi importante para estimular a internacionalização da empresa.

A integração obtida através do MERCOSUL foi importante, entre outros fatores, por sinalizar ao mercado um poder maior de estruturação e convergência econômica e política. Condição essa que serve de base para a atração de investimentos. A previsibilidade tornou-se mais presente dentro do continente fomentando o comércio intra-regional e novos investimentos de empresas regionais e estrangeiras que tentam aproveitar as vantagens e os atrativos do mercado ampliado. A Vale, portanto, beneficia-se por conta desses fatores, além, também, da criação de uma personalidade jurídica alinhada, que garante maior estabilidade a região.

 O Mercado de Mineração

 O mercado de mineração é caracterizado por investimentos de longo prazo, acentuada dispersão geográfica e intensivo em capital. Os investimentos são de longo prazo, dado que há uma grande necessidade de montagem de uma estrutura operacional para, então, começar a explorar e produzir o minério. A acentuada dispersão geográfica diz respeito à dependência que a empresa possui por estar localizada onde a matéria-prima se encontra, e à questão de que os recursos estão espalhados por todo o mundo.

  O uso intensivo do capital, por sua vez, deve-se ao alto volume de recursos financeiros necessários para movimentar a indústria, desde os equipamentos de extração, produção e transporte dos minérios, até as instalações físicas e tecnologias associadas aos processos.

 As motivações existentes para a internacionalização de empresas neste setor estão baseadas na busca pelo aumento do volume de produção/exploração de recursos, a busca por novos mercados para comercializar e fortalecer os negócios, e a procura pela maximização dos investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento.

 As companhias procuram investir em segmentos onde já atuam no exterior, visto que não há mais possibilidade de crescimento em volume de produção dentro do mercado doméstico. As empresas do setor de mineração também buscam diversificar o mix de minérios, aproveitando as oportunidades para realizar investimentos em diferentes países e diminuindo a dependência e os riscos atrelados ao negócio.

 A privatização e a relação com o governo

 As privatizações no Brasil visavam, sobretudo, reduzir o déficit público e dar maior eficiência ao estado. Em países emergentes, como o Brasil, esse processo ganha um fator extra: atrair investimento externo e suprir os desequilíbrios da balança de pagamentos, tendo, por consequência, a aceleração do processo de globalização.

Apesar de já terem passado, aproximadamente, quatorze anos da privatização da Vale, a relação com o governo continua estreita. O governo brasileiro configura-se como um dos principais acionistas da empresa, e com ações Ordinárias, ou seja, com direito de voto nas decisões corporativas.

 Além desse fato, como consta também no relatório anual de 2010, o governo brasileiro ainda possui doze golden shares, que são ações preferenciais de classe especial, e de titularidade exclusiva da União Federal. Tais ações permitem ao detentor o direito de vetar quaisquer propostas em relação a determinados assuntos como: liquidação da empresa, mudança do objeto social relativa à exploração de jazidas minerais, entre outros.

 A aquisição da INCO

 A aquisição da mineradora canadense Inco foi um grande marco na historia da indústria brasileira. A aquisição custou aproximadamente USD 19 bilhões de dólares e foi o recorde, em termos de volume, na historia das corporações brasileiras. Tal fator demonstra a importância da aquisição para a Vale que, na ocasião, saltou de quarta para segunda maior empresa do mundo no setor.

 A compra Inco, - maior detentora de reservas de níquel do planeta -, trouxe inegáveis benefícios para a Vale. O principal produto da companhia continua a ser o minério de ferro, com aproximadamente 50% da receitas, segundo dados de 2011. No entanto, a dependência desse produto era muito maior no passado.

 É importante considerarmos não apenas a dependência no produto, como também do mercado consumidor, já que a China é o principal mercado da empresa e para onde é destinado grande parte a produção comercializada, onde aproximadamente 35% das receitas da Vale são obtidas. Pelo fato dos EUA serem um grande cliente da Inco, isso apresenta uma possibilidade de redução da dependência da Vale com relação ao mercado chinês.

 Além disso, com a aquisição da Inco – e, paralelamente, de outros ativos - a empresa conseguiu diversificar suas fontes de receitas. Hoje quase 10% da receita da companhia provem do níquel. Além disso foi uma estratégia que visava diversificar a gama de seus produtos e aumentar a sua competitividade.

 A confiabilidade da marca pode ser considerada uma força da Vale, uma vez que a empresa possui a sua própria identidade sendo reconhecida mundialmente pela sua trajetória e seu compromisso com o mercado. Hoje ela é a segunda maior mineradora do mercado e sua marca esta atrelada a isso, trazendo credibilidade. 

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